Deputados e juristas condenam punição a servidores por críticas em redes sociais

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A nota técnica da Controladoria-Geral da União (CGU) que afirma que os servidores que criticarem o órgão de governo em que atuam podem ser punidos repercutiu de maneira negativa entre entidades da sociedade civil, juristas e parlamentares. A líder do Psol na Câmara, Fernanda Melchionna (RS), afirmou que a nota é um “ataque explícito à liberdade de expressão dos servidores públicos federais”.

O governo Bolsonaro tem tomado medidas sem nenhuma base técnica e muitas vezes anticientíficas em diversos órgãos. A denúncia das irregularidades é um direito e, mais, um dever do servidor. Não é a primeira vez que ações deste tipo acontecem, como mostra a nota técnica do Ibama com o mesmo tom e o dossiê feito pelo Ministério da Justiça a respeito servidores que se posicionam contra o fascismo.

O Psol já acionou o MP em outras ocasiões sobre esse assunto e estuda as medidas judiciais possíveis de serem tomadas agora, mas desde já nos engajamos na denúncia deste absurdo”, concluiu a deputada.

O líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon (RJ), apresentou um requerimento de informação para o ministro da CGU, Wagner de Campos Rosário. No requerimento (veja a íntegra aqui), Molon questiona qual foi o caso que desencadeou a nota técnica.

No documento da CGU, o órgão afirma que servidores que criticarem as instituições de governo, mesmo fora do horário e ambiente de trabalho, podem ser punidos. Molon questiona se isso não fere o artigo 5º da Constituição Federal, que garante a todo cidadão o princípio da legalidade, bem como a liberdade de manifestação do pensamento.

“Tentar amordaçar servidores é resquício autoritário, coisa de quem não consegue entender e aceitar o que significa o regime democrático. Inaceitável”, afirmou o líder ao site.

“Como qualquer processo que vise a sancionar pessoas, também no direito administrativo, o sancionador deve ter por base direitos fundamentais dos acusados – no caso, os servidores”, afirmou ao Congresso em Foco o mestre em Direito Constitucional, André Portugal. “É uma garantia do cidadão – e o servidor não deixa de ser um cidadão – que as sanções sejam previstas em lei, pelo legislador democraticamente eleito, e não por uma burocracia desprovida de legitimidade democrática direta. Então, em abstrato, seria possível cogitar de uma violação à legalidade quando há a criação de infrações disciplinares pela CGU”, afirmou o jurista.

Na nota, a CGU afirma que o servidor que, mesmo em seu momento de folga, vier a levar “repercussão negativa à imagem e credibilidade de sua instituição”, poderá ser punido. Sobre isso, André Portugal acredita que, por serem termos “excessivamente abertos”, podem “abrir espaço para o arbítrio estatal contra servidores públicos que, bem intencionados, limitem-se a fazer críticas legítimas e que tenham por único objetivo o aprimoramento das instituições de que fazem parte”.

O especialista ressalta que o “servidor que vier a ser prejudicado ou sancionado pela media pode recorrer ao Judiciário, especialmente pela via do mandado de segurança, alegando em seu favor a ilegalidade e a inconstitucionalidade da previsão legal”.

A advogada especializada em direito trabalhista Mayara Gaze afirmou ao site que a nota da CGU é “um tanto abusiva em relação aos servidores públicos submetidos ao regime jurídico único da União, uma vez que extrapola o comando legal inserido na Lei 8112/90, de forma a invadir a esfera privada do servidor”.

“O documento da CGU soa como atentado à liberdade de expressão, direito fundamental previsto na constituição, o que revela traços de governos totalitários e antidemocráticos. A constituição já impõe limites à liberdade de expressão, quando tipifica condutas que atentam contra outro direitos constitucionais. É o caso da calúnia, injúria e difamação, crimes contra a honra tutelados pelo direito penal”, explicou a jurista.

“Esse tipo de proibição é abusiva e atenta contra a liberdade de expressão garantida a todos os cidadãos. Mesmo na esfera empresarial privada, não faz sentido coibir condutas e opiniões praticadas por seus funcionários fora do ambiente e horário de trabalho, e fora de suas atribuições. Contudo, é recomendável que a empresa ou o órgão público elabore um código de ética com divulgação ampla a todos os funcionários, estabelecendo requisitos mínimos de boas práticas dentro e fora da empresa. A liberdade de expressão é garantia fundamental prevista na constituição e sua violação indica traços de governos ditatoriais”, concluiu.

A Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas), emitiu uma nota afirmando que “a Constituição da República assegura a liberdade de manifestação do pensamento, de expressão e de crítica, que, como corolário da cidadania, é ampla e inclui não apenas as informações e opiniões inofensivas, indiferentes ou elogiáveis, mas também, e sobretudo, as que possam causar alguma inquietação ou incômodo, já que a liberdade conforma a opinião pública e é um pilar fundamental da democracia, do controle social das instituições e da correta atuação de seus agentes. Integrar carreiras relevantíssimas de Estado, na Magistratura e no Ministério Público, não diminui ou elimina a liberdade inerente ao pleno exercício da cidadania”.

Fonte: Congresso em Foco

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