Regulação de redes em outros países teve ameaças e “apagão” de big techs

O Google retirou do ar uma ferramenta de notícias na Espanha e ameaçou bloquear o uso de seu mecanismo de busca na Austrália. O Wikipedia realizou um “apagão” na Itália, e o Facebook prometeu vetar conteúdos jornalísticos em sua plataforma na Europa

MATEUS NINO (MARABÁ, PA) — A regulamentação das mídias sociais tem sido motivo de debates acalorados e enfrenta resistência tanto dentro do Congresso quanto do governo federal no Brasil. Esse processo tem sido marcado por polêmicas e tem levado empresas do setor, como o Google e o Telegram, a se oporem à regulamentação, levando o caso até mesmo à Justiça. Recentemente, a Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitou ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a abertura de um inquérito para investigar diretores de mídias sociais por suposta “conduta abusiva”.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) chegou a associar a reação das plataformas a milícias digitais. No início deste mês, Moraes intensificou o tom ao afirmar que as empresas têm contribuído ilegalmente com a disseminação de desinformação pelas milícias digitais nas redes sociais.

No entanto, as reações severas das gigantes da tecnologia não são exclusivas do projeto de lei das Fake News no Brasil. O Google retirou do ar uma ferramenta de notícias na Espanha e ameaçou bloquear o uso de seu mecanismo de busca na Austrália. O Wikipedia realizou um “apagão” na Itália, e o Facebook prometeu vetar conteúdos jornalísticos em sua plataforma na Europa. Essas ações são reações a medidas governamentais relacionadas a direitos autorais, fiscalização e remoção de conteúdo.

O embate entre governos e gigantes da tecnologia em relação a legislações semelhantes ocorre há pelo menos duas décadas. Cerca de 40 leis de regulação de mídias sociais foram aprovadas em vários países, e outras 30 estão em desenvolvimento. No entanto, o contexto brasileiro apresenta particularidades.

O projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados apresenta cinco pontos polêmicos: definição do responsável pela fiscalização, punição das redes pela veiculação de conteúdo criminoso impulsionado, remuneração de conteúdos jornalísticos, imunidade parlamentar na internet e forma de remuneração de direitos autorais.

Especialistas consultados pelo Metrópoles avaliam que a maioria das medidas já foi discutida e implementada em outros países. No entanto, o contexto atual no Brasil, marcado pela disseminação acelerada de notícias falsas nas redes sociais, pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro e pelos ataques a escolas, torna a situação brasileira diferente das demais regulamentações em todo o mundo.

“No caso do Brasil, vemos que essa questão está sendo levada a uma discussão extrema. Se olharmos para a legislação semelhante existente na União Europeia (UE), nunca houve acusações que levaram a suspeitas de censura. Esse é o argumento central de uma parte da política brasileira”, pondera o professor italiano Nicolo Zingales, especialista em Direito e Regulação da Informação da Fundação Getulio Vargas (FGV).

O especialista ressalta que não se pode ignorar a realidade brasileira, que é altamente polarizada e tem gerado uma quantidade significativa de desinformação sobre o tema. Segundo ele, é necessário esclarecer quais medidas de salvaguarda serão adotadas para evitar uma remoção arbitrária de conteúdo.

Em 2019, o Parlamento Europeu aprovou o Artigo 17 da Diretiva de Direitos Autorais da União Europeia, que tornou as plataformas digitais responsáveis pelo conteúdo publicado em seus sites, com foco principalmente nos direitos autorais. Essa norma estabeleceu um prazo até junho de 2021 para que as plataformas se adequassem às novas regras.

Na época, o Google protestou e divulgou imagens mostrando como as páginas de busca ficariam após a implementação das novas diretrizes. Alegou que seria necessário evitar o uso de todo o material protegido por direitos autorais, como miniaturas de fotos em branco e a remoção de pré-visualizações de matérias.

Por sua vez, a Wikipédia realizou um “apagão” na Itália, bloqueando o acesso às páginas como forma de protesto contra a lei. Em 2014, o Google também encerrou o serviço de Notícias na Espanha em retaliação a uma norma semelhante. O serviço ficou indisponível por sete anos, sendo restabelecido somente em 2022.

Em 2021, o buscador ameaçou retirar completamente seu serviço de pesquisa da Austrália durante negociações sobre o pagamento de conteúdo jornalístico. No entanto, o primeiro-ministro do país na época, Scott Morrison, afirmou que os legisladores não cederiam a “chantagens”.

Diante da falta de resultados com abordagens anteriores, as grandes empresas de tecnologia adotaram uma estratégia diferente no Brasil este ano. Pela primeira vez, elas publicaram conteúdos patrocinados, como fizeram o Google e o Telegram na última semana, posicionando-se contrariamente às propostas governamentais. Essas ações levaram inclusive à abertura de um inquérito no STF.

A discussão sobre a regulamentação das mídias sociais continua em andamento no Brasil, com diferentes perspectivas e interesses em jogo. O desafio é encontrar um equilíbrio entre a liberdade de expressão, a proteção dos direitos autorais e o combate à desinformação, para garantir um ambiente digital mais seguro e responsável. (Com informações de Metrópoles)

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