Entenda o que está por trás das operações federais no garimpo de Canaã dos Carajás

Advogado ambiental Vinícius Borba conversou com o Portal Debate e lançou luz sobre vários aspectos relacionados ao caso dos mineradores artesanais da região da Vila Nova Jerusalém, cuja área foi alvo de embargo do Ibama nesta semana
Foto: Divulgação

CANAÃ DOS CARAJÁS (PA) — A região de Canaã dos Carajás, no sudeste do Pará, tem sido alvo de intensas operações de fiscalização ambiental nos últimos dias, especialmente em garimpos locais. Essas ações têm gerado discussões em âmbito regional e nacional, muitas vezes mencionando a mineradora Vale, direta ou indiretamente, no centro desses acontecimentos. Para analisar essa situação complexa e entender suas implicações, o Portal Debate procurou o advogado ambiental Vinícius Borba, que lançou luz sobre vários aspectos do caso.

Vinícius Borba começa enfatizando que a profissão de garimpeiro não é ilegal, como muitos podem pensar. Pelo contrário, ela é mencionada na Constituição Federal, conforme o artigo 174, parágrafo 4º, que confere preferência às cooperativas nos processos de legalização das atividades de garimpagem. No entanto, na prática, essa preferência nem sempre é respeitada.

Borba ressalta que as operações de fiscalização não podem ser vistas de forma isolada, pois são parte de um conjunto de problemas envolvendo ilegalidades e inoperâncias por parte do Estado. Ele aponta que muitos mineradores artesanais aguardam por décadas a análise de seus pedidos de Permissão de Lavra Garimpeira (PLG) pela Agência Nacional de Mineração (ANM).

Além disso, o advogado observa que em algumas operações de fiscalização há excessos por parte dos fiscais, e ele enfatiza a importância de denunciar tais casos. Outra questão levantada por Vinícius Borba é a destruição de maquinários, que, segundo ele, não é uma regra, mas sim uma exceção, e deve ser aplicada apenas em casos extremos.

Foto: Divulgação/PF

No dia 30 de agosto, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) emitiu um embargo amplo sobre a área da Vila Nova Jerusalém, nas proximidades do Parque Nacional dos Campos Ferruginosos, restringindo atividades de mineração não autorizadas de cobre na região. Vinícius Borba esclarece que os Campos Ferruginosos são uma unidade de conservação ambiental criada em 2017 como condicionante do licenciamento do projeto S11D da Vale.

O que intriga Borba é o fato de, ao consultar os registros da Agência Nacional de Mineração, serem encontradas outorgas minerárias em nome de grandes empresas dentro da área embargada, próxima ao Parque Nacional dos Campos Ferruginosos. Essas outorgas incluem uma de cobre em nome da Vale, datada de 1969, e outra de minério de cobre em nome da Adipex, de 1996. Curiosamente, duas cooperativas também buscam regularização para suas atividades na mesma área.

Foto: Reprodução

Uma dessas cooperativas é a Cooperativa dos Mineiros do Estado do Pará (Coamep), que requer um processo de Permissão de Lavra Garimpeira (PLG) para extrair minério legalmente. No entanto, ela se depara com obstáculos, como o embargo imposto pelo IBAMA à área de seu pedido e a presença de uma outorga de mineração da Vale na mesma região desde 1969.

Segundo Vinícius Borba, a solução para essa situação reside na abordagem séria por parte da Agência Nacional de Mineração (ANM). Na avaliação do advogado, é essencial que a agência encerre outorgas que permanecem sem análise ou implementação por décadas. Depois desse trabalho pela ANM, cabe a cada minerador, preferencialmente organizado em cooperativas, requerer sua PLG junto à ANM. Borba também ressalta que nem todos os minérios são garimpáveis, como o cobre, que possui um regime próprio de exploração.

Nesse sentido, uma vez concedida uma outorga minerária, há um prazo para a empresa iniciar a mineração, regulamentando assim os pequenos mineradores. Isso permitirá que cooperativas e associações de mineradores deixem de ser estigmatizadas e passem a ser reconhecidas como profissionais, conforme previsto na Constituição Federal.

Advogado ambiental Dr. Vinícius Borba durante visita ao IBAMA, em Brasília-DF | Foto: Arquivo Pessoal

Questionado com relação à Vale extrair ouro e declarar apenas cobre e manganês, deixando de pagar mais de R$ 400 milhões em tributos para Marabá e Canaã dos Carajás, Borba observa que a questão dos royalties sempre foi polêmica e sublinha a importância de fiscalizar se a quantidade de minério extraído corresponde aos royalties pagos. Ele ressalta que as CPIs que investigam a Vale devem esclarecer essas suspeitas e responsabilizar a empresa caso elas se confirmem.

Nesta esteira, Vinícius Borba afirma que a Vale também é fiscalizada e autuada pelos órgãos ambientais. No entanto, ele destaca que, devido ao poder financeiro e político da Vale, essas ações não afetam sua produção e rentabilidade, ao contrário do que ocorre com os mineradores artesanais, cujos sonhos muitas vezes são prejudicados pela destruição de seus maquinários.

Perguntado se o IBAMA ainda teria prerrogativa de manter a área embargada mesmo com os pedidos de regularização dos mineradores artesanais junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DMPM) e Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), em Belém, Vinícius Borba esclarece que o embargo da área pelo IBAMA, em tese, não prejudica a análise dos pedidos de regularização, pois se trata de um ato preventivo que ainda pode ser contestado perante o órgão e o Poder Judiciário. Ele destaca que esse tipo de embargo é regulamentado pela IN 15 de 05/06/2023 e pode abranger até mesmo toda a área de um município.

O advogado reconhece que, diante do atual cenário político brasileiro, o futuro dos pequenos mineradores na região não parece muito promissor. Outrossim, ele enfatiza que o devido processo legal, a ampla defesa, o contraditório e os princípios constitucionais ainda estão em vigor no Brasil. Diante dessa incerteza, Borba destaca a importância de os pequenos mineradores se organizarem em associações ou cooperativas fortes e bem representadas.

Vinícius Borba encerra a entrevista ressaltando a importância de se encarar esse problema com a devida seriedade. Ele argumenta que o debate sobre a atuação da Vale na região de Canaã dos Carajás e seus impactos na economia e no meio ambiente é crucial e deve receber uma atenção minuciosa das autoridades competentes. A situação é complexa, e as implicações envolvem não apenas questões ambientais, mas também sociais e econômicas que afetam diretamente a vida dos habitantes da região. (Portal Debate)

Assista à análise do Dr. Vinícius Borba:

Relacionados

Postagens Relacionadas

Nenhum encontrado

Cadastre-se e receba notificações de novas postagens!