Decisão do STF que responsabiliza imprensa por acusações de entrevistados gera polêmica entre veículos

A tese jurídica dividiu parte dos veículos de imprensa e gerou diversas formas de repercussão pelas redes sociais nos últimos dias

Na última semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou a tese jurídica que permite a responsabilização de veículos de imprensa pela publicação de entrevistas nas quais sejam imputados falsamente crimes contra terceiros. Pelo entendimento, o princípio constitucional da liberdade de imprensa impede a censura prévia de conteúdos publicados. Porém, se um entrevistado acusar falsamente outra pessoa, a publicação poderá ser responsabilizada judicialmente. A tese jurídica dividiu parte dos veículos de imprensa e gerou diversas formas de repercussão pelas redes sociais nos últimos dias.

Jornalismo ‘vulnerável’

O editorial do site Poder 360, especializado em cobertura política, diz que a decisão deixa o jornalismo vulnerável e cita que diante de tais regras não seriam possíveis novos casos notáveis como, em 2005, o caso do então presidente do PTB, Roberto Jefferson, que uma longa entrevista para o jornal ‘Folha de S.Paulo’, fazendo acusações gravíssimas de um esquema de propinas que depois ficou conhecido como mensalão. O Poder 360 cita que, quando Jefferson concedeu a entrevista, não ofereceu nenhum material de prova para sustentar as acusações que faziam, mas que posteriormente se revelaram verdadeiras.

Inibição do jornalismo investigativo

Já o portal O Antagonista, declarou que considera que a medida inibe a atividade do jornalismo investigativo, obrigando o exercício de uma ‘autocensura’ preliminar.

Caminhos para um ‘jornalismo responsável’

Antes da votação, nove organizações, incluindo a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e a ONG Repórteres Sem Fronteiras, afirmaram por meio de manifestação conjunta que havia risco de “verdadeira e indesejável autocensura” nos veículos de comunicação brasileiros, mas após o julgamento, a presidente da Fenaj, Samira de Castro, disse que a tese elaborada agora cria “um grau de responsabilização minimamente condizente com nossas preocupações da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão”. O posicionamento também é partilhado pelo grupo O Globo.

“Esse dever de cuidado que os ministros citam é, na verdade, o fato de você ouvir o outro lado e dar espaço para o contraditório na medida em que o seu entrevistado impute o que posteriormente for chamado de falso crime, (como) calúnia, injúria e difamação”, diz Samira. Segundo ela, isso “abre espaço para um jornalismo responsável, que pratique de forma ética o direito ao contraditório.”

Por outro lado, em nova nota publicada após a decisão, a Abraji declarou que espera que o tema seja melhor delineado para melhor entendimento dos profissionais do direito e também das redações:

“Esperamos que o Supremo, na redação do acórdão do julgamento, traga parâmetros mais concretos sobre o que entende como “indícios concretos” da falsidade das informações divulgadas e quais atos de cuidado deverão ser observados pelos veículos para que não sejam responsabilizados por informações ditas por terceiros, respeitando os preceitos da liberdade de imprensa que não podem ser restringidos ou afetados.”

“Ao mesmo tempo, esperamos que os tribunais brasileiros apliquem a tese considerando a sua especificidade e condições, e evitem decisões que resultem no cerceamento do trabalho jornalístico exercido com ética e responsabilidade.”

Avanço

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) declarou que a decisão do Supremo representa “avanço” em relação a ameaças sobre a liberdade de imprensa, que também foi garantida no julgamento. No entanto, a ANJ ressaltou que a decisão reforça a responsabilidade de imprensa sobre o que publica, mas ainda “pairam dúvidas” sobre outras questões.

“A ANJ espera que, na elaboração e publicação do acórdão de inteiro teor sobre o julgamento, tais dúvidas sejam dirimidas, bem como outras situações não explicitadas, como no caso de entrevistas ao vivo, sempre em favor da preservação do preceito constitucional da liberdade de imprensa”, declarou a entidade.

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