O pórtico, bonito por sinal, colocado na entrada do bairro Marabá Pioneira, vem gerando polêmicas entre os especialistas em Língua Portuguesa em Marabá. Abaixo da estrutura de ferro, em forma de um grande tucunaré, está estampada a frase BEM VINDOS À MARABÁ PIONEIRA, utilizando o acento indicador de crase diante da construção linguística “à Marabá Pioneira”.
De acordo com a enciclopédia livre Wikipédia, a etimologia da palavra “Marabá” é de um vocábulo indígena mayr-abá, que significa “filho do estrangeiro com a índia” ou ainda, “fruto da índia com o branco”, logo a palavra Marabá seria de gênero masculino. Há ainda que se levar em consideração, o “erro de concordância de gênero”, decorrente da rica linguagem popular, algo natural e aceitável em uma língua, entre o substantivo masculino Marabá e adjetivo feminino Pioneira.
Do ponto de vista puramente gramatical, a expressão correta teria que ser “Marabá Pioneiro”, não “Marabá Pioneira”, pois quem exerce a função de núcleo de uma construção sintática nominal, é sempre um substantivo. Na expressão Marabá Pioneira, todas as flexões das palavras adjacentes deverão levar em consideração o gênero masculino e o número singular da palavra Marabá.
De acordo com o gramático, Domingos Paschoal Cegalla, em sua Novíssima gramática da língua portuguesa, “Concordância é o princípio sintático segundo o qual as palavras dependentes se harmonizam nas suas flexões, com as palavras de que dependem”. Esta definição inviabilizaria a construção Marabá Pioneira sob o ângulo frio da gramática normativa.
Para alguns estudiosos, o uso da crase na construção Bem vindo à Marabá Pioneira se justificaria pelo aspecto histórico-semântico, porque a cidade de Marabá se iniciou no hoje bairro Velha Marabá. Algo mais ou menos assim: “Bem Vindos à cidade Marabá Pioneira”, omitindo-se a palavra “cidade” da frase em debate.
O conceituado gramático, Evanildo Bechara, na Moderna Gramática Portuguesa, define que não se usa crase diante de palavra masculina como em “Todos os dias, o homem percorria vários quilômetros a pé para chegar ao local de trabalho”. Bechara ainda diz que se o nome de lugar estiver determinado, admite artigo, portanto há crase.
No entanto, o especificador mencionado em todos os exemplos, de qualquer gramático, aparece sempre no gênero feminino com em “Fomos à Roma dos papas” e “O romeiro foi à Belém do Círio de Nazaré”, onde as palavras Roma e Belém pertencem ao gênero feminino, não ao gênero masculino como na expressão à Marabá. Nessa óptica, os defensores desta teoria estariam equivocados.
A crase é a contração da preposição a com o artigo definido feminino a/as. Em vez de escrever, por exemplo, “Bem-vindo a a Bahia”, juntamos preposição e artigo, com o acento grave indicando a contração: “Bem-vindo à Bahia”.
É claro que o mesmo não ocorre em “Bem-vindos a Marabá”, pois o artigo masculino forma com a preposição outro tipo de contração. Esta definição evidencia a regência da preposição a da palavra composta Bem vindos, porém não referenda o artigo feminino a antes do vocábulo masculino Marabá.
No caso de nomes próprios geográficos, substitui-se o verbo da frase pelo verbo voltar. Caso resulte na expressão “voltar da”, há a confirmação da crase. “Faremos uma visita à Bahia”. “Faz dois dias que voltamos da Bahia”. Neste caso, a crase é confirmada. No entanto, na expressão “Bem vindo à Marabá”, o termo regente é “Bem vindos”, não é um verbo qualquer para poder ser trocado por uma das formas do verbo “voltar”, conforme descreve o Prof. Pasquale Cipro Neto.
Ao meu ver, a utilização da expressão popular “a Marabá Pioneira” também estaria errada porque Marabá Pioneira é um bairro, não uma cidade para levar um artigo feminino antes de “Bem-vindos”. A frase correta do ponto de vista gramatical seria “O Marabá Pioneira”, derivada de “Bem-vindos ao bairro Marabá Pioneira”, logo a frase colocada abaixo do tucunaré teria que está escrita desta forma: “Bem-vindos ao bairro Marabá Pioneira”.
A definição de Domingos Paschoal Cegalla, Evanildo Bechara e Pasquale Cipro Neto não aceita o uso da crase na expressão “Bem vindos à Marabá”. O trio está entre os gramáticos mais respeitados do país em relação à língua portuguesa. A grafia correta da frase é “Bem-vindos a Marabá”, porque a palavra “bem-vindos” é escrita com hífen.
Eu sou partidária das definições gramaticais adotadas por eles até que se prove a existência de um novo termo especificador que transforme uma palavra de gênero masculino em outra de gênero feminino e que ela passe a aceitar o uso da crase. Como a língua de um povo é algo vivo, em constante mutação, não duvido de nada.
Pedro Ribeiro de Souza
Licenciado em Letras e Artes – Universidade Federal do Pará
Especialista em Produção de Texto – Universidade Federal do Pará
Membro da Associação Brasileira dos Jornalistas (ABJ)
Prof. Rede Pública de Ensino do Estado do Pará